A professora estadual preparava, no apartamento residencial, a aula
para o turno da tarde. As crianças estavam no colégio e o marido no
foro, onde exercia a magistratura. De repente, o porteiro avisa pelo
interfone:
- Está aqui um oficial de justiça...
Antes que a informação fosse completada, a professora permitiu:
- Diga-lhe que suba, por favor - acreditando que o visitante estivesse trazendo talvez um malote com processos para o marido.
Introduzido no apartamento e satisfeito com a fidalguia (“
o senhor aceita um cafezinho?”), o oficial de justiça ficou constrangido e desculpou-se:
- Sei que é desagradável, mas estou aqui para cumprir uma ordem de
despejo, por falta de pagamento de aluguéis. Breve estará chegando um
caminhão da empresa de mudanças e eu, sem querer causar-lhe
constrangimentos, pediria que a senhora facilitasse o meu trabalho.
A professora quase desabou - pediu para olhar o mandado e, atônita, constatou e informou:
- Esse mandado está assinado pelo meu marido... deve haver um engano.
Nós moramos aqui há quatro anos, o imóvel é de nossa propriedade e
sempre pagamos nossas contas em dia.
Feita uma ligação para o cartório judicial, o juiz interrompeu a
audiência que presidia e ouviu atônito, sucessivamente, o relato da
própria mulher e do oficial de justiça.
Esclarecidas as coisas e suspenso o despejo, o oficial voltou ao foro
e, na vara, escutou a mesma explicação que o ativo juiz teve que,
depois, na hora do almoço, dar para a esposa.
Como o magistrado costumava, ele próprio, digitar seus despachos e
decisões, fora vencido pelo estresse e, no final de uma sentença,
concluíra: “
isto posto, decreto o imediato despejo do inquilino residente na rua Vasco da Gama nº xxx, apto. yyy. Expeça-se mandado”.
A sentença era justa, jurídica e, como de hábito, reveladora de que o
prolator dera pronta prestação jurisdicional. Só que, por equívoco,
colocara seu próprio endereço residencial. Era - como até hoje se
comenta na vara - “
o autodespejo”.
Feitas as correções etc, foi expedido novo mandado, dessa vez efetivamente cumprido na rua Cabral nº xxx, apto. yyy.
A coincidência fora a de que ambos os endereços - no mesmo bairro -
homenageavam vultos pátrios. Na semana seguinte, o juiz entrou em férias
para se recuperar da estafa, causada pelo comparecimento ao trabalho:
sempre os dois turnos completos, de segunda a sexta - e, às vezes,
também aos sábados e domingos.
Assiduidade que, a propósito, hoje não se vê mais...fonte Espaço Vital